domingo, 11 de maio de 2014

reflexões sobre a cidade, parte II

eu estava andando ontem pela praça da sé quando os prédios velhos do entorno começaram a cair sobre a minha cabeça; aquela sensação conhecida de que só aqui eu faço sentido. são paulo, você é a grande protagonista dessa história. só mesmo uma cidade dessa magnitude poderia abrigar todos os meus amores. somente uma cidade desse tamanho poderia sintetizar toda a minha dor de existir. aqui, todos os dramas cabem. eu respiro o ar de maio, com seu cheio peculiar de queimado e rio pinheiros e sei: sou eu aqui. eu não conheço o exílio porque sou isso aqui. às vezes eu te odeio como uma intensidade que parece que não vou aguentar, mas eu aguento. viver aqui é resistir. viver aqui é sobreviver. é entender todos os lugares do mundo a partir da premissa do que não é, do que jamais poderá ser. e isso não é uma coisa boa. como esse senso opressor de pertencimento também não é. você me moldou. é opressiva, chega a doer às vezes. mas cada dia tem um essa coisa de pequenas poéticas urbanas e malucas. lindas...pontes quebradas e estacionamentos no centro. eu te romantizei, cidade do caralho. te romantizei para poder respirar, e meu deus...que ar pesado...cheio de lembranças...maio...
já aconteceu a você de sentir o cheiro de alguém impregnado à própria noite?
sinto isso aqui. é tão misturado que não sei mais quem é quem, quem é ele, quem é a cidade, fria e impetuosa, choro sempre entre as estações Anhangabaú e Pedro II, quando o metrô mostra a cidade desnuda por cima dos trilhos: me sinto extasiada. eu sempre soube, desde pequena, que são paulo iria me arrasar sem dó: é muita lembrança, é muita história. é muita grandeza, é muita pobreza.
será que só agora eu percebi o esforço diário e absolutamente dialético que faço pra não te ter e te fazer permanecer na minha vida? tu és a cidade dos meus pesadelos, mas também é contigo que tenho os sonhos mais bonitos.
só tu, feia, cinza e errada pra me fazer amar como se não houvesse amanhã, me emprestando suas sarjetas e ruas sem saída pros meus espetáculos de bêbada sentimental de batom vermelho. sem julgamento, sem pressa, sou só mais uma a perambular por aí de coração quebrado e fodido. você conhece bem o clichê.
porque tu és maior clichê da minha vida, sua filha da puta. 
as igrejas. as igrejas do centro da cidade. porque elas fazem isso comigo? eu entro para adorar os santos que não acredito, eu entro com vontade a procura de luz e alguma direção pra esse caminho e saio arrasada como se tivesse uma bigorna ancorada ao peito. me conheces demais, cidade maldita. me conheces demais. visito as criptas porque de certa forma também me sinto meio morta, mas daí corro pelas avenidas e sei lá, sangue nas veias tudo de novo. alguma coisa acontece no coração da gente sim. tem como evitar não. é um ciclo sem fim de adoração e sofrimento. de entrega e paixão, de ódio, rancor e mudança de rotas no gps. devoção.
Alguém olhou pela janela do Metro na estação Pedro II e gritou com raiva: "Puta cidade bonita dos infernos" eu não conseguiria definir melhor.

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