sexta-feira, 11 de setembro de 2015

igreja do paissandu ou uma prece para santa donata

ele nunca visitou uma igreja comigo.

jamais, em hipótese alguma ele sairia no meio de uma noite chuvosa, a pé, para ver a santinha morta. ele jamais conseguiria. ele tem medo, tem pavor. a igreja da santa ifigênia, escura e gótica então, nunca. ouvir canto gregoriano no mosteiro de são bento num domingo de manhã? você só pode ser louca.

ele nunca visitou uma igreja comigo.

mas ele sempre pega na minha mão quando caminhamos na rua; toma banho comigo e me pede para ensaboar as suas costas. me chama de rainha, de linda, de minha. dorme todo dia abraçado. cozinha pra mim com tanto amor que é o meu chefe preferido. ri deliciosamente. chora com emoção. me deu as chaves de sua casa. me embala e me faz gritar como nunca. a minha vontade em ser eu mesma com ele é genuína e verdadeira. sou eu de mim ali, um todo. uma pessoa possível, uma mulher amada.
e eu amo. como amo.


ele nunca visitou uma igreja comigo, mas me beijou e disse "tá, um dia talvez eu vá com você"
é tudo o que eu preciso.




terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Impressões sobre uma cidade que é a minha

desci no largo são francisco, mas eu já podia sentir a agitação das minhas entranhas ao subir ao rua perpendicular que nos leva à ruína de tudo. o centro histórico de são paulo faz com que eu me sinta absolutamente local e completamente estrangeira, é uma dualidade tão maluca que não dá pra explicar. andei e andei e andei pela rua XV de novembro, nigerianos vendendo relógios dourados e rindo, pernambucanos fazendo repente alegremente enquanto a alguns metros peruanos descendentes de manco capac o próprio, o primeiro rei da cidade de cuzco, tocavam flautinhas e dançavam,  e outras dúzias de pessoas assistiam atentamente um maluco enganá-las com aqueles truques baratos do centro da cidade. eu observava tudo como se fosse a primeira vez, sendo que não era, nasci nessas ruas feias, movimentadas, corridas. corre esse sangue em mim desde o principio dos tempos. desci as ruas todas, saboreando o contentamento de fazer parte; olhei pros coxas guardando as esquinas, coisa mais paulistana não há, coxas por toda a parte, fumando cigarros e encarando pessoas. quase saí do corpo quando olhei de relance pro pateo do colégio, tão velho e esquecido e maltratado por nós e pelo tempo inexorável que só faz passar. e senti uma fobia maravilhosa ao ver todos aqueles edifícios mal assombrados no entorno da praça joão mendes, todos os povos do mundo se encontram ali, pode ter certeza. e ao passar pelo descampado vale do Anhangabaú era como se os prédios rissem e despencassem sobre mim são paulo abriga todo mundo. e quando você sente o mal-estar do pertencimento, você sabe, está visível e estampado na sua cara. aquele desconforto de caber e não caber aqui. o desconforto de existir num lugar tão improvável.  pertencer não significa ter nascido aqui, significa que a cidade adentrou o seu coração, lá no fundo. e uma vez que ela entrou, ela não saí mais.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Pravda

às vezes procuro teu nome no google
vou nas imagens
busco teu rosto idiota no meio de tantos outros idiotas
e quando você aparece
eu me assusto
e fecho a página
num pulo